"Meus
amigos são todos assim: metade loucura, outra metade santidade.
Escolho-os
não pela pele, mas pela pupila, que tem brilho questionador e tonalidade
inquietante.
Fico
com aqueles que fazem de mim louco e santo.
Deles
não quero a resposta, quero meu avesso.
Que
me tragam dúvidas e angústias e aguentem o que há de pior em mim.
Para
isso, só sendo louco.
Louco
que senta e espera a chegada da lua cheia.
Quero-os
santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.
Escolho
meus amigos pela cara lavada e pela alma exposta.
Não
quero só ombro ou o colo, quero também sua maior alegria.
Amigo
que não ri junto, não sabe sofrer junto. (...)
(...)
Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade.
Não
quero risos previsíveis, nem choros piedosos.
Pena,
não tenho nem de mim mesmo, e risada, só ofereço ao acaso.
Quero
amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas
lutam para que a fantasia não desapareça.
Não
quero amigos adultos, nem chatos.
Quero-os
metade infância metade velhice.
Crianças,
para que não esqueçam o valor do vento no rosto, e velhos, para que nunca
tenham pressa.
Tenho
amigos para saber quem sou, pois vendo-os loucos e santos, bobos e sérios,
crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a normalidade é uma ilusão
imbecil e estéril".
Fernando
Pessoa
https://dedindeproza.wordpress.com/tag/fernando-pessoa
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